Vencedor do prêmio Nobel da Paz de 1980, o argentino Adolfo Pérez Esquivel afirmou nesta quinta-feira (28), em discurso na tribuna do Senado, que “há grandes dificuldades de um golpe” no Brasil, referindo-se ao processo de impeachment que está em curso no Congresso Nacional. A declaração gerou protestos imediatos de senadores oposicionistas que acompanhavam a sessão.
Arquiteto, escultor e militantes de direitos humanos, o argentino foi autorizado a fazer o discurso pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que presidia a sessão de debates do Senado no início da tarde desta quinta. Esquivel ganhou o Nobel da Paz por conta de seu trabalho como coordenador, na década de 1970, da fundação do Servicio Paz y Justicia en América Latina (Serpaj-AL) na cidade colombiana de Medelin. À época, a fundação difundiu o combate aos regimes militares da América do Sul por meio da “não-violência ativa”.
“Venho ao Brasil trazendo a solidariedade e o apoio de muita gente na América Latina para que se respeite a continuidade da constituição e do direito do povo de viver em democracia. Há grandes dificuldades de um golpe de Estado, que já aconteceu em outros países do continente, como Honduras e Paraguai. Espero que saia o melhor deste recinto [o Senado] para o bem da democracia e da vida do povo do Brasil”, afirmou Esquivel.
Irritado com a declaração do prêmio Nobel, o senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO) classificou a fala de “inaceitável” e ressaltou que não poderia ter sido permitida pelo plenário do Senado. “Estou indignado com o que aconteceu neste parlamento”, protestou Ataídes.
O senador tucano, então, solicitou ao presidente da sessão que retirasse todo o discurso de Esquivel das ata taquigráficas da sessão do dia do Senado.
Paulo Paim, no entanto, afirmou que havia autorizado o Nobel da Paz a falar desde que não entrasse em detalhes sobre o processo de impeachment em tramitação no Senado. Diante da revolta de parlamentares da oposição, Paim determinou que a palavra “golpe” fosse retirada da ata que registra os pronunciamentos dos senadores no plenário.
Para o líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), o discurso de Esquivel “não foi por acaso”, mas planejado por governistas. “Nós não podemos ser surpreendidos com essas montagens. Foi premeditado. Não foi por acaso que este senhor [Esquivel] veio aqui fazer esse pronunciamento. Isso é uma estratégia que este plenário não admite”, discursou Caiado.
O líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB), questionou a concessão de palavra ao Nobel da Paz, que não é detentor de mandato parlamentar. Paim, entretanto, justificou sua decisão afirmando que a autorização para o pronunciamento foi uma “gentileza” do Senado com Adolfo Esquivel para fazer uma “saudação” ao parlamento.
Encontro com Dilma
Mais cedo, Esquivel havia se reunido com a presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto paramanifestar solidariedade à petista, que pode ser afastada do mandato por até 180 dias se os senadores autorizarem a instauração do processo de impeachment.
Após o encontro, que durou cerca de 40 minutos no Planalto, Esquivel afirmou que a reunião serviu para ele levar “solidariedade e apoio” à presidente Dilma em razão do atual cenário político do país. Para ele, é “muito claro” que está em curso no Brasil um “golpe de Estado, encoberto sobre o que podemos chamar de golpe branco”.
Esquivel comparou ainda o impeachment que Dilma enfrenta no Congresso aos processos de destituição dos ex-presidentes do Paraguai Fernando Lugo, em 2012, e de Honduras Manuel Zelaya, em 2005.
“Dissemos à presidenta que viemos dar solidariedade e apoio a ela e para que não se interrompa o processo constitucional no Brasil porque isso seria, não só para o povo brasileiro, mas para toda a América Latina, um retrocesso muito grave”, afirmou o vencedor do Nobel da Paz de 1980.