Um dos momentos mais tensos para qualquer pessoa da comunidade LGBTT é o de se abrir honestamente com a família a respeito da própria sexualidade. Um processo delicado e muito difícil que, na maioria dos casos, acaba por expor preconceitos e até violência por parte daqueles que deveriam prestar cuidados incondicionalmente
A diretora e roteirista Mary Agnes Donoghue (de “Paraíso”) discute essas relações em “Casamento de Verdade”, um melodrama com generosas doses de condescendência sobre a situação. Embora não vá a fundo na questão, ainda assim apresenta um olhar delicado sobre o tema.
A história é centrada no drama de Jenny (Katherine Heigl). Com mais de 30 anos, independente e aparentemente bem-resolvida, há cinco anos mora com sua namorada Kitty (Alexis Bledel), com quem pretende se casar. O problema é que ela jamais foi franca com sua família, que tenta sempre empurrar um “bom partido” para a filha solteira, que ainda vive com uma “colega de quarto”.
Como nunca aceita as investidas dos rapazes a ela apresentados, a irmã, Anne (Grace Gummer), e a mãe, Rose (Linda Emond), passam a acreditar que Jenny, na verdade, tem um relacionamento com um homem casado. Uma situação insustentável, que só termina quando Anne flagra a irmã beijando Kitty em uma loja de noivas. É o começo do processo.
Se Jenny, por um lado, enxerga a revelação com alívio, Rose e Eddie (o pai interpretado por Tom Wilkinson) entram em choque. Não se trata aqui da omissão ou mentira, mas o fato de não tolerarem a filha como lésbica. Logo há um enfrentamento e Jenny, até então sensível e serena, adquire características mercuriais, que produzem um racha na família.
Esse ponto destaca Katherine Heigl, que demonstra uma capacidade surpreendente de alternar insegurança e belicosidade em uma mesma tomada. Os monólogos sobre a necessidade de tolerância se revezam com ataques à própria tolerância. Em questões familiares, ninguém quer ser tolerado, mas amado. E Tom Wilkinson está lá, como opositor, em uma interpretação sólida, assistido por um roteiro afiado.
O talento da dupla e os diálogos, no fim, são os grandes trunfos da produção, que se torna complacente demais com as feridas abertas. Mary Agnes Donoghue apenas arranha a superfície, pois não desenvolve bem os conflitos entre os personagens em relação ao desfecho que apresenta. É doce demais.
Na mesma temática, uma série de outros filmes se mostra mais aguerrida, como “C.R.A.Z.Y. – Loucos de Amor” (2005), “De Repente, Califórnia” (2007), “Orações para Bobby” (2009), ou mesmo o mais recente “Azul é a Cor Mais Quente” (2013).