Um livro que reúne contos criados por 17 detentos será lançado em Joinville, no Norte de Santa Catarina. “Contos tirados de mim – A literatura no cárcere” traz histórias imaginárias escritas a partir de uma oficina literária por 17 presos – três mulheres e 14 homens. Eles darão autógrafos no evento aberto ao público para lançar o título, na quinta-feira (28), às 20h, na Penitenciária Industrial de Joinville.
“São contos, histórias criadas, talvez inspiradas no que eles vivem, mas não são autobiográficas”, detalha o juiz João Marcos Buch, da Vara de Execuções Penais da Comarca de Joinville (veja o trecho de um conto ao final da reportagem).
Segundo ele, a iniciativa é pioneira e é também a primeira vez que os presos têm a oportunidade de manifestarem seu lado criativo através da escrita.
“Pessoalmente eles não me falaram, mas relataram aos professores, ao editor. Eles estão fascinados pela possibilidade de se libertarem através da escrita. Durante a oficina, da noite para o dia vinham com uma história. Eles iam para as celas e ficavam pensando no que iam escrever. Alguns mandaram cartas para mim agradecendo”, conta o juiz.
Os autores têm idade entre 20 e 39 anos e cumprem penas diversas. “No final de cada texto, alguns colocaram qual a pena que cumprem. Eles escolheram o que seria dito sobre eles. Por questão de segurança e ética, sugeri que não identificassem o crime”, detalha Buch.
Ler para reduzir a pena
Os presos participam de um projeto de leitura desde 2013. Os apenados leem um livro por mês e escrevem uma resenha, que depois é avaliada por professores. Assim, a cada texto entregue, diminuem quatro dias da pena. Em um ano, é possível reduzir até 48 dias.
“Como algumas penas são demoradas, esperamos seis meses para fazer o encaminhamento à Justiça, para não ficar todo mês pedindo redução de quatro dias”, explica o juiz.
Oficina literária
Uma editora de São Paulo soube do trabalho e propôs que os presos escrevessem. “Enviaram 19 relatos, mas eu queria contos. Com isso, fizemos uma oficina literária de uma semana para desconstruir os relatos e transformá-los em contos”, detalha o editor do livro, Alex Giostri.
O livro conta com notas introdutórias da escritora e psicanalista Betty Milan e do dramaturgo, psicanalista e psiquiatra Antonio Quinet. Buch e Giostri também têm textos no livro. O lançamento do livro terá a presença do ator Luís Melo.
Mais livros
Segundo Buch e Giostri, o objetivo é continuar com o projeto de leituras e com as oficinas literárias no sistema prisional de Joinville. “A equipe que escreveu os contos vai aprofundar para trabalhar em dupla e faremos a turma “2”, com novos relatos. A ideia é publicar dois livros por ano. Queremos também ter um acompanhamento quando eles estiverem em liberdade”, conta Giostri.
Para o juiz da Vara de Execuções Penais, o projeto pode servir de modelo. “Não sei a dimensão que está fazendo aos detentos, mas para mim é de muita satisfação, de saber que é possível reduzir os índices de violência, de transformar pessoas através da leitura, pela arte”.
Confira o trecho de um dos contos
“Logo viraram amigos inseparáveis. Alice e Pipoca. E eles se aventuravam correndo pelas manhãs, pelo quintal afora aproveitando a vida de criança. Um segundo de descuido de Alice, e Pipoca fugiu por uma pequena fresta no portão e correu disparado em meio a buzinadas e freadas no meio da rua. Alice vendo-o em perigo, abriu o portão e correu desesperada em direção a Pipoca, tinha a intenção de salvá-lo do pior.”